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domingo, 19 de abril de 2009

"Ser humano é lutar pela plenitude da vida." Frei Betto



Gostaria muito de dividir com vocês um encontro que foi realizado em Belém - Pará no fim de janeiro, pois recebi uma apresentação pelo e-mail e achei fundamental colocar a idéia aqui, pois vai de encontro com muito do que sinto, penso e defendo - O Fórum Social Mundial http://www.fsm2009amazonia.org.br/


Eu estava planejando ir, mas devido o comprometimento com algumas atividades não fui, mas estava lá de coração e principalmente em ideal.


"Ser humano é lutar pela plenitude da vida." Frei Betto

Um outro mundo é possível.

De 27 de janeiro a 1º de fevereiro de 2009, a cidade de Belém, Pará, sediou a nona edição do Fórum Social mundial. Um evento que contou com aproximadamente cem mil inscritos, provindos de mais de 160 países. Representantes de movimentos sociais, de tradições religiosas e espirituais, ONGs, intelectuais solidários, universitários, estudantes, cidadãos do mundo.
A confluência das mais variadas lutas em prol da dignidade humana. Cem mil mentes e corações em busca de caminhos para um outro mundo possível. Um outro mundo possível que comporte os sonhos da menina palestina e da menina brasileira. Um outro mundo possível onde sejam respeitados os direitos básicos da menina africana, da menina peruana e da menina afegã.

E dentre as tantas atividades realizadas durante o Fórum Social estavam as palestras proferidas pelo teólogo, professor e escritor Leonardo Boff ( homem este de extrema sensibilidade que me foi apresentado por dois amigos maravilhosos - minha ex professora de Educação Ambiental e pelo meu querido amigo ex-frei franciscano Wílson Simpa - que me presenteou três livros deste homem maravilhoso: A Oração de São Francisco - Uma mensagem de paz para o mundo atual, Espiritualidade - Um caminho de Transformação, Fundamentalismo - A Globalização e o Futuro da Humanidade).
Num dos encontros, cujo o tema era 'Diálogo com movimentos de Juventude pelo Meio Ambiente", ele se reuniu especificamente com os jovens. Estudantes, universitários, ativistas, sonhadores, em busca de um outro mundo possível. A enorme tenda mostrou-se pequena para abrigar todos os interessados por ouvir as suas palavras. Palavras de sabedoria, palavras de compaixão. E Leonardo Boff, iniciou a sua exposição falando sobre a crise financeira que assola o mundo. US$ 15 trilhões de dólares evaporados em questão de poucos dias, levando consigo imensas corporações, grandes bancos e tradicionais fábricas. E deixando para trás, em meio às frias estatísticas, as demissões em massa, o desemprego, a fome, o desespero, as lágrimas. Uma crise que não assolou a periferia, mas o coração do império. E Leonardo Boff lembrou que as artimanhas sutis do capital procurarão se refazer. Dirão - os economistas, as corporações transnacionais e os detentores do poder - que o capitalismo vive de crises, e que esta é mais uma crise cíclica. E tentarão nos empurrar mais do mesmo, mais consumo, mais conflitos, mais individualismo. Porém, a crise atual é terminal. O desafio não e remediar o que não tem conserto, mas buscar novas alternativas. O sistema atual, regido pelo capital e pelas leis do mercado, que, em sua natureza, é voraz, acumulador, depredador do meio ambiente, criador de desigualdades e sem sentido de solidariedade, atesta a sua própria falência.
Um sitema onde a cada quatro minutos uma pessoa perde a visão em decorrência da carência de vitamina A, declara o seu próprio fracasso. Um sistema onde a cada cinco segundos uma criança com menos de cinco anos morre de fome ou desnutrição atesta sua própria falência. Um sistema que crious desumanos sofrimentos e gritantes desigualdades. O sistema vigente, que tem como pilar um individualismo avassalador, demonstrou-se incapaz de assegurar o bem-estar da humanidade.

Um individualismo que se revela na linguagem cotidiana: O meu emrego, o meu salário, a minha casa, o meu carro, a minha família. Um sistema onde ninguém é levado a construir algo em comum, onde a competição, o acúmulo e a ostentação predominam em detrimento da solidariedade, da caridade e da compaixão. Um sistema onde as crianças aprendem tão cedo a conjugar o verbo COMPRAR, mas que desconhecem o que seja COMPARTILHAR.
Um sistema que incentiva o consumismo inconsequente e desenfreado, e que tanto cultua os bens materiais. uma cultura que dissemina compulsão e consumismo, que associa o produto a um conceito de felicidade. Um sistema que desconhece o amor, a caridade e a compaixão, e que se fez cego e surdo para o apelo do excluído, do necessitado.
O oposto do amor não é o ódio, mas a indiferença. Um sistema que por longas décadas alega não possuir recursos para promover a educação, a saúde e para aplacar a fome mundial, mas que tanto fasta com guerras, conflitos e com a indústria bélica, e que se mostra capaz de mobilizar em poucas horas três trilhões de dólares para socorrer bancos, montadores e corretoras, atesta seu próprio fracasso terminal.
Como foi que permitimos chegar a esse ponto? Quanto tempo ainda haverá de passar até que resgatemos a nossa humanidade perdida? Um punhado de farinha e água para enganar a fome, acrescido, nos dias de sorte, de um pouco de sal.
Além da crise financeira, no deparamos também com a crise ambiental. A falta de solidariedade que impera nossas relações sociais. E a falta de solidariedade com a Natureza. A ânsia pelo crescimento econômico, aliada ao consumismo compulsivo, resultou na dilapidação sem precedentes da Natureza. O atual modelo econômico fracassou contra a própria humanidade e contra o planeta. O bem-estar de todos e a preservação da Terra são sacrificados ao lucro de poucos. O consumo inconsequente aumentou o desperdício, a produção de lixo e os impactos ambientais. E poluímos mares e rios.
O desenvolvimento técnico-científico, dissociado da consciência ecológica, fez com que saqueássemos os recursos naturais numa escala sem precedentes. e a ruptura entre o trabalho e o cuidado fez com que o afã desmedido de produção se revertesse na ânsia incontida de dominação das forças da natureza. Os limites do capitalismo são os limites, tanto da Terra quanto do capitalismo. Já não mais podemos prosseguir com a perversa lógica do capital, baseada no acúmulo e no desperdício: "Quem não tem quer; quem tem quer mais; quem tem mais diz que nunca é suficiente". A lógica do capital que tanto incentiva o supérfluo, a ostentação e o desperdício. os atuais padrões de extração, produção e consumo, mostraram-se insustentáveis, além da capacidade de reposição e regenaração do planeta. A Terra está dando sinais inequívocos de que já não aguenta mais. Sinais como a escassez de água potável, e o aquecimento global. Sinais como as mudanças climáticas, que já começaram a afligir crescentes parcelas da população ao redor do planeta. A terra é um planeta pequeno, velho e limitado que não suporta um projeto de exploração ilimitada.
As crises financeira, climática, energética e outras, - todas elas nos remetem a crise do paradigma dominante. Precisamos de um novo paradigma de civilização porque o atual chegou ao seu fim e exauriu suas possibilidades. Projeções feitas por pesquisadores e cientista ambientais mostram que, se o consumo continuar no ritmo atual, em 2050 precisaremos de dois planetas Terra.
Qual o mundo que iremos deixar para as próximas gerações? Cultivar a solidariedade intergeracional, para com os que virão depois de nós. Eles também precisam satisfazer suas necessidades e habitar um planeta minimamente saudável. Buscar novos valores. Alimentar novas esperanças. Novos rumos e novos paradigmas. A interculturalidade, - o diálogo entre o chamado saber ocidental e o saber tradicional, milenar, a cosmovisão indígena. As tradições dos povos nativos falam do ser humano como jardineiro. Conforme ensinam tais tradições, o ser humano deve cultivar a Terra com cuidado e senso de justiça e estética. A proteção da vitalidade, diveridade e beleza da Terra é nosso dever sagrado. Devemos lançar um novo olhar sobre a realidade, adotar um novo paradigma de relacionamento com todos os seres.
O universo caminhou 15 milhões de anos para produzir o planeta que habitamos, essa admirável obra que nós, seres humanos, recebemos como herança, para cuidar como jardineiros, e preservar como guardiões fiéis. Somos todos interdependentes uns dos outros, coexistimos no mesmo cosmos e na mesma natureza.
Uma mesma fonte alimentadora, misteriosa e inominável, sustenta e confere vida a tudo que existe. O mesmo Sopro permeia toda a existência. A vida é milagre tão belo quanto curto, que deve ser cultivado como as flores mais belas. Como nunca antes na história o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. Promover a ecologia do cuidado, que zela pelos interesses de toda a comunidade de vida. Coexistir com respeito, cooperação e harmonia com os demais moradores deste planeta, - animais, vegetais, seres humanos. A interculturalidade, o encontro com outras tradições, outras culturas, enriquece a nossa visão do mundo e da vida. Ter olhos para os que são diferentes. Ter ouvidos para a voz, as suas melodias, canções, histórias.
Habitamos todos uma Casa comum. Temos uma origem comum, certamente, um destino comum. As tantas flores, com suas cores e formas distintas. Diferenças superficiais, pois a terra que as nutre é uma. Um único Sopro as anima, conferindo-lhes significado, sentido e vida. O desafio do tempo presente é o de resgatar as utopias esquecidas, reescrever o noso sonho comum. Um único Sopro, uma única alma, uma mesma esperança. E em meio a agitada rotina da vida moderna, encontrar tempo para refletir sobre perguntas metafísicas. Ter ouvidos para a voz que fala em nós, que nos convosa a prática do bem e que diante de uma noite estrelada nos pergunta: "Quem sustenta e se esconde atrás daquelas estrelas?" A voz que, quando diante de um recém nascido, com respeito e admiração pergunta: "Quem foi que produziu essa vida?..." " Onde é que, no olhar da criança, começa o céu e acaba a terra?"
Pra terminar, segundo a sensibilidade de Albert Einstein que na minha opinião explica parte do paradigma dominante na sociedade atual enfatizado por Leonado Boff em sua explanação e conclui a humilde citação de Frei Betto no título deste post: "o ser humano vivencia a si mesmo, seus pensamentos,como algo separado do resto do universo numa espécie de ilusão de óptica de sua consciência. e essa ilusão é um tipo de prisão que nos restringe a nossos desejos pessoais, conceitos a ao afeto apenas pelas pessoas mais próximas.Nossa principal tarefa é a de nos livrarmos dessa prisão ampliando nosso circulo de compaixão para que ele abranja todos os seres vivos e toda a natureza em sua beleza. Ninguém conseguirá atingir completamente este objetivo mas, lutar pela sua realização, já é por si só parte de nossa liberação e o alicerce de nossa segurança interior."

3 comentários:

Aline 20 de abril de 2009 às 06:28  

Ufa!!! Acho que a conversa de ontem te inspirou a fazer este post. Afinal: habitamos uma casa comum, temos uma origem comum, certamente um destino comum. Certeza...
BJuss
Lov U

Aline 21 de abril de 2009 às 11:51  

Feeee
tem um selinho pra vc lá no blog....
bjuss

The man on the Amsterdam flight,  22 de abril de 2009 às 15:44  

Hum, hum... Bom, Fernanda, vc escreve bem mesmo e acho que a sua capacidade de argumentacao nao tem concorrencia nao ;-).

O unico que eu falaria sao duas coisas:

1. Foram pessoas, como vc e como eu, que criaram o "sistema", e por tanto, qualquer outro "sistema" ia a funcionar dum geito igual ou pior. A palavra sistema, eh usada para despersonalicar coisas que foram feitas por pessoas. Culpar ao sistema eh facil demais as vezes. Eh um cliche' Freudiano...

2. Nao se esqueca que as ultimas 2 decadas foram as que viram a maior reduccao da pobreca na historia da humanidade. Quando olho atrais e vejo a guerras mundiais, a esperanca de vida duma crianca, a fome, acho que a nostalgia do pasado eh um recurso mais poetico do que racoavel...

Lembre-se, o grande Garcia-Lorca, com quem vc comecou esse seu blog, morreu numa guerra selvagem, num mundo miseravel e cheio de odio. E esso, pelomenos ali em Granada, nao ia a acontecer agora...

Vc leu ao Nietzsche alguma vez? Eu recomendo. O grande poeta da "VIDA". Sofremento, eh, ao final, vida tambem. Vida nao eh felicidade, pois ela nao existe sem sofremento, como nao existe branco sem preto.

Beijao,

M

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